quinta-feira, 18 de julho de 2019

TREMENDO MAU GOSTO


Tremendo mau gosto
 Ronald Mendonça
 Médico e professor da Ufal

     Uma das vantagens da liberdade de imprensa é a possibilidade de as pessoas tomarem ciência dos fatos que as rodeiam sem precisar sair de casa. Nesse aspecto, o valor do salário da professora Heloísa Helena é um exemplo.
     Depois que o presidente Lula, durante a campanha para a reeleição, alardeou que havia “devolvido a dignidade” aos funcionários federais, poucos poderiam imaginar que um professor universitário estivesse recebendo essa merreca.
     Que Lula, um inimigo irreconciliável de leituras, trate de forma desdenhosa os professores é até compreensível. O intolerável mesmo é que o intelectual Fernando Henrique, nos seus oito anos, tenha sido tão cruel com o universo do magistério.
     Como uma moeda tem sempre duas faces, é inevitável que se diga que, afinal de contas, o valor não é tão ruim assim, uma vez que há milhões de brasileiros que sobrevivem com o salário mínimo (até com o Bolsa-família). Então, que raio de privilégio é esse? De onde se tirou essa idéia de que professor precisa ganhar bem?
Igual raciocínio é aplicado aos médicos. Coincidência ou não, nossa decadência iniciou-se quando “movimentos sociais” forçaram a barra e a classe médica passou a integrar a “categoria da saúde”. Desde então, pagamos o preço pela vala comum.
     O momento é de suspense. Tentando livrar-se da “vala comum”, os médicos alagoanos têm a seu favor um plano de cargos assinado pelo governo anterior. O risco, hoje, é de mais uma vez se decepcionarem.
     Eu próprio, que mantenho fluida ligação com a secretaria da saúde, amargo três meses de salários atrasados.
     Na cruzada para tentar receber pelo que já trabalhei, tenho dificuldades em acessar os detalhes dos descontos – verdadeiras multas – aplicados ao vencimento. Falar em sacanagem é até gentileza.
     É nesse clima de pré-indigência que bandidos regionais e interestaduais elegeram consultórios médicos para assaltar. A crise deve estar grande. Especializar-se em assaltos a consultórios médicos é de um tremendo mau gosto. Pelo amor de Deus, alguém aí precisa avisar urgente a esses bandidos que os médicos são uns lisos. Seus clientes pertencem a planos de saúde e não pagam em dinheiro vivo.
     E vivem tão apertados quanto. (Os ricos se tratam lá fora.) Muitos deles têm como causa da doença justamente as dificuldades financeiras. Ufa! Essa semana a polícia prendeu a quadrilha. Que ninguém se anime. Em breve a justiça vai botar todo mundo na rua.
27/01/2007

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