De novelas e vilões
Sem que isso signifique vergonha, orgulho ou dissimulação, apenas de vez em quando dou uma olhada na novela “Páginas da Vida”. Apesar da sofrível assiduidade é possível acompanhar razoavelmente o enredo. Como os capítulos se arrastam em doses homeopáticas, seguir o fio da meada, depois de perder dois ou três episódios, não é nenhuma vocação especial. Aliás, os novelistas armam a coisa visando também esse público pouco fiel, que não faz da novela um compromisso inadiável.
Conquanto caricaturais, de alguma forma, enredos e personagens de novelas tentam reproduzir situações e figuras da vida real, criando identificações e antipatias no telespectador. Claro que sempre existem o talento e a beleza dos atores a serem checados. É justamente nesse conjunto que reside a força do folhetim.
Ouço dizer que cada autor tem sua especialidade. Alguns gostam do mato, dos senhores poderosos, do contraste e das aproximações de fundo escravagista/abolicionista. Casados com mulheres submissas, o personagem tudo domina, mas sua vida pessoal é marcada por filhos porras-loucas.
Outros noveleiros apreciam abordagens de cunho político. Numa das vertentes botam um sujeito que odeia o desprezível modus vivendi burguês. No contra-ponto, um reformado do exército, truculento, burro e preconceituoso, que odeia comunistas, pobres e homossexuais. Por azar, a linda filha do milico apaixona-se pelo comuna, larga a casa dos pais e parte para a clandestinidade. Para apimentar a trama, há um frade que fuma, bebe, lê Marx e Engels e morre de culpas porque está de olho numa paroquiana.
Na condição de avós, Nadja e eu, em “Páginas da Vida” vemos com simpatia o personagem Alex, avô do garoto Francisco, que trava luta desigual para manter o neto junto a si. A personagem Marta, esposa de Alex, não desperta igual sentimento. Conspirando de forma suja, a insensível avó não faz a menor questão em manter a guarda de Francisco; sem remorsos, quer mais é se arrumar. Sua venalidade é chocante.
Pulando agora para a vida real, penso na indignação gerada pela venalidade dos gestores públicos. Vilões que deixaram os Estados em situação de indigência, com salários atrasados e cofres arrombados.
Como até o final da novela, a personagem Marta deverá ser punida, ludibriada pela própria irmã, cumprir-se-á uma lição moralizadora. Ao contrário, os que se locupletaram no erário, gozarão das benesses e têm risco zero de serem incomodados.
13/01/2007
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