A última lição
Ronald Mendonça
Convencidos da existência de algum mérito neste velho professor de neurologia, os médicos que a Universidade Federal de Alagoas diplomou esta semana decidiram incluir seu nome no rol dos docentes homenageados.
Tradição no universo das academias de ensino, essa espécie de “preito de gratidão” é o sentimento tornado público de que algo marcou na alma dos jovens médicos. Para os que recebem, as homenagens dos alunos não devem ser encaradas apenas como prêmios, mas, sobretudo, como incentivos para continuar a lide. Atingido pela flecha da vaidade, sinto-me impelido ao pecado de expor essa “última lição”.
O fato é que para os legítimos donos da festa, os formandos, um novo ciclo foi deflagrado. Feiticeiros da era moderna, chegou a hora de fazer a sintonia fina dos conhecimentos. Como a experiência é filha da vivência, certamente o caminho ensinará a caminhar. Por esse viés, em relação às outras profissões, a médica leva boa vantagem. É que na pátria-mãe-gentil, apesar de Lula e FHC, não se conhecem, ainda, médicos desempregados. Mal-remunerados, explorados e humilhados até a medula por cânceres chamadas de SUS e planos de saúde, isso tem. Aos montes.
Por falar em salários baixos, não deixou de ter seu lado picaresco o confronto ministro do Supremo X deputados e senadores para saber quem ganha mais. Luta de titãs, no que pese todos terem salários altíssimos, o legislativo vergonhosamente silenciou quando o ministro Marco Aurélio Mello garantiu que os nobres representantes do povo recebem pelo menos três vezes mais – caqueirada em torno de 70 mil por mês. O detalhe sórdido é que essa gente quer ter um aumento salarial de mais de 90 por cento.
Voltemos ao que interessa. Lidando com o que existe de mais precioso no ser humano, dos esculápios são cobrados, além de padrões éticos e morais irrepreensíveis, conhecimentos técnicos atualizados, presteza, delicadeza, temperança, bom humor, espírito republicano e inexcedível capacidade de desprezo aos bens materiais. Sem dúvida, é do mister médico a bondade. Como vêem, é quase uma tarefa sobre-humana.
Finalmente, não esperem gratidão. Na sua curta e trágica existência, por conta de curas espantosas, o próprio Cristo estigmatizou a dimensão que concedia à Medicina. Foi mais longe: ensinando sobre a gratidão humana, utilizou como matéria prima a recuperação de leprosos. Com efeito, dos dez favorecidos pelo milagre, apenas um voltaria para agradecer.
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