domingo, 11 de dezembro de 2011
O DRAGÃO SUBMISSO
Nos anos 60 do século 20, um parente – fumante compulsivo e contumaz frequentador de rodas de dominó e cachaça – apareceu rouquenho. A despeito das limitações tecnológicas da época, finalmente descobriu-se um câncer na laringe. Em São Paulo, o famoso Jorge Fairbanks, do HC, amputou-lhe boa parte do órgão e garantiu-lhe uma sobrevivência de cerca de duas décadas. Lembro de sua figura franzina, voz perto do inaudível, com um véu ao pescoço a proteger-lhe a redentora traqueostomia. Se a Souza Cruz perdeu um consumidor, a bomba de sena e a lapadinha comemoraram o retorno glorioso de um dos seus grandes astros. Desde então, muita água passaria sob a ponte. Hoje, dependendo do estágio da doença, protocolos de tratamento já dispensam o bisturi do cirurgião, as grandes mutilações, optando por modelos mais conservadores, não obstante, muitas vezes devastadores em relação ao estado geral do portador.Como um macabro e inopinado desígnio, tendo como pano de fundo a hereditariedade e outros “fatores de risco”, a estatística mostraria sua fria face para o nosso ex-presidente. Íntimo da caninha e do tabaco – segundo dizem – alçado à condição de semideus pelo povão e puxa-sacos em geral, a doença tem despertado comentários dispares. Isolados os radicais, que exigem que Lula vá para o inferno do HGE Osvaldo Brandão, o câncer ex-presidencial sugere algumas reflexões. Há que se dizer que a população leva de 2 a 4 meses para iniciar um tratamento de câncer. Pelo SUS, químio, radioterapia e a própria cirurgia são verdadeiras roletas russas. Certos Planos de Saúde são igualmente desgraçados. A regra é clara: todos os setores devem ter preços justos, menos os serviços médicos. É por isso que a magra sinistra deita e rola. Apologista inflamado do sistema de saúde, a quem denominou (brincando?) do mais perfeito do mundo, Lula e bajuladores até que poderiam se desculpar e admitir que toda aquela fala não passava de proselitismo etílico. Mas como? Se é por essas e outras que se está mantendo no poder o que existe de mais puro e belo, e inocente como a flor, da política brasileira.Em meio a comoventes explosões de otimismo, uma aura a mais irisa a figura de Inácio: a de herói de corpo fechado, um São Jorge de bordel, com sua certeira lança no gogó do terrível dragão do câncer, tornado dócil, humilde e submisso diante de indômita coragem, de ilibada moral. Síntese de Teseu, Ulisses e Hércules, nenhum bicho cabeludo lho prevalecerá.
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