Cesarianas voltaram à baila com a divulgação das altas taxas, superando a marca de partos vaginais, relatados como normais. Lembro meu pai retornando de suas jornadas médicas, atravessando noites, depois de extenuantes partos. Naquele 1945, optar por ser clínico geral em Bebedouro era estar disposto a encarar desde a diarréia infantil ao parto caseiro à luz de candeeiro.
Parturientes não faltavam, inclusive na própria casa. Minha mãe teve onze filhos, todos partejados por quem contribuiu com a concepção. Sem ser exceção entre os obstetras da época, não foi treinado para realizar cesarianas, habilidade que, segundo as estatísticas, teria necessitado em 15% das vezes. Ou seja, 1,5 de seus filhos teriam indicação para o método.
Tudo se move, como disse o imortal Luiz Nogueira, invocando Galileu Galilei. Séculos se passariam desde o áspero monólogo entre o Criador e suas telúricas criaturas. Naquela manhã, Deus pegaria pesado com aqueles dois cretinos irresponsáveis, que jogaram tudo fora por conta de uma rapidinha. Ainda mais vindo com aquela conversa mole de serpente, maçã, tentação...
Com a expulsão do Paraíso, dentre outras retaliações, a mulher, coitada, ficaria condenada às dores do parto, maldição parcialmente contornada com a invenção da anestesia. Presume-se que Jeová não apreciou ser contrariado. Talvez por isso, o SUS pague tão miseravelmente aos parteiros e anestesistas, um dos alegados motivos da diminuição dos partos vaginais.
A ultrasonografia, cada vez mais detalhista, desfez a mística e as surpresas de um útero grávido. Há tempo de conceber e tempo de nascer. Mais de três filhos, nem pensar. Parir como índia sem viver como tal, soa jocoso. O SUS, por sua vez, quase exterminou os pediatras. Quem vai cuidar das crianças?
Conspira-se para o parto vaginal virar exceção. É tarefa hercúlea encontrar um médico disposto a permanecer semivigil, por R$ 60,00, 8-12 horas seguidas, na expectativa de um incerto nascimento. Além de tudo, data venia obstetras-ecologistas, considero o parto normal uma violência da natureza.
Volto ao meu pai. Migrando da Clínica Geral para outra área, livrou-se dos partos à luz de candeeiros, mas não escapou das “cesáreas”. Sim, na psiquiatria, ao lidar com delirantes e psicopatas, passou a conviver com simulacros de Cristo, Napoleão e César. Ao original do último, equivocadamente, atribui-se beneficiamento com a satanizada cirurgia.
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