domingo, 11 de dezembro de 2011

MURILLO

Discretamente, quase silenciosamente, Murillo Gameleira Vaz partiu sem ter tempo de se despedir dos amigos e admiradores. Todas as semanas, enviava-lhe meus artigos, antes de serem publicados na Gazeta. Fino cronista, ele também me permitia uma leitura antecipada dos seus brilhantes textos que, por coincidência, eram divulgados no O Jornal, também aos sábados.
Há poucos meses, ao saber que estava se despedindo das crônicas regulares deixei registrado em artigo, certamente voz de seus cativos leitores, a frustração de não poder mais degustar de dissertação de tão alto nível. Murillo engrandecia o gênero.
Nascido nas Alagoas, cedo nosso pranteado amigo entrou em contato com a intelectualidade nativa. O pai, jornalista, escritor, cronista e biógrafo Augusto Vaz Filho era um respeitado homem das letras. Membro do IHGAL, fundador da Academia Maceioense de Letras, costumava conduzir o filho ainda menino às tertúlias do Centro Cultural Emílio de Maya.
Depois de passar pelos diários locais, Murillo foi buscar auroras no Rio de Janeiro. Gauchiste à Drummond, o final dos últimos anos 50 vai encontrá-lo em Moscou integrando comitiva brasileira num Congresso, passagem que registrou no seu livro “Relances - Crônicas, quase sempre”. Por conta disso, Sebastião Nery em sua coluna o homenageou com extensos comentários.
A experiência dessa imersão parece ter sido marcante para Murillinho, como era carinhosamente tratado, parte pela compleição franzina, parte pela imanente doçura. Traço de caráter, fugia do modelo de esquerdismo astigmata em que se escamoteiam os horrores do regime para “não dar carne a gato aos adversários”. Muito menos, deixou-se enganar ou seduzir por cargos e outros mimos.
Em nosso longo e último bate papo, por telefone, falamos de tudo: do Francisco Reinaldo e seu ABC das Alagoas, da minha eleição para a AAL, da via crucis para ter o seu novo livro editado pela Universidade de Juiz de Fora...
Aniversariantes do mesmo decanato de janeiro, fingia que não acreditava que eu não era um discípulo de Omar Cardoso, famoso horoscopista do século passado. Nessas horas, me interrogava: “Então, mestre, que reservam os mistérios e desígnios dos astros aos capricornianos, nesses próximos dias?”
Acho que não pressentiu que a magra sinistra o espreitava. Tinha projetos. Além do livro, insistia para que eu descobrisse o telefone do filho do Jorge Cooper. Era um aficionado do poeta. Creio que morre em paz alguém que pensa em poesia.

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