terça-feira, 4 de agosto de 2015

ENTREVISTA DE JOSÉ MEDEIROS




Cultura é a representação de todas as vertentes humanas; ou cultura erudita ou cultura popular deve sempre ser levada ao povo como uma forma de compreensão, de educação. Eu costumo sempre dizer: “educação é um dote que não se gasta, um direito que não se perde e uma liberdade que não se limita”.
[...]

CONTRASTE
Pe. Antonio Tomaz
Quando partimos, no vigor dos anos,
Da vida pela estrada florescente,
As esperanças vão conosco à frente,
E vão ficando atrás os desenganos.

Rindo e cantando, céleres e ufanos,
Vamos marchando, descuidosamente...
Eis que chega a velhice de repente,
Desfazendo as ilusões, matando enganos.

Então, nos enxergamos claramente
Quanto a existência é rápida e fugaz,
E vemos que sucede exatamente

O contrário dos tempos de rapaz:
— Os desenganos vão conosco a frente,
E as esperanças vão ficando atrás!

Então eu luto para que esses desenganos não tomem conta de mim de maneira nenhuma. Eu mantenho a esperança como a chama que eu cultivo diariamente, com fé inabalável em Deus e a certeza de que a gente vive tanto quanto é possível, mas o problema não é viver muito, é viver bem; é ter qualidade de vida/ é saber se cuidar adequadamente; é fazer com que o nosso corpo e a nossa mente permaneçam o número de anos que for possível ao serviço da humanidade, das pessoas, porque sendo médico foi isso que eu fiz, é isso que eu faço e é isso que eu espero... farei sempre, se não mais na clínica, que foi de 40 anos, mas através da crônica. Durante 16 anos eu mantenho a crônica na Gazeta de Alagoas e aí eu prego tudo isso que eu aprendi. Eu conto tudo isso que vivi ao longo do tempo, porque diz-se que médico para escrever não precisa de mais nada, digamos assim, basta contar os causos que ele viu durante a vida, e são tantos causos, que ,usando a palavra popular que aconteceram, que a gente vai gradualmente fazendo, digamos assim, a continuidade disso. Muita gente pergunta: “Zé Medeiros, porque é que você não escreve suas memórias?” Eu digo: “porque quem escreveu 16 anos, toda semana, já contou boa parte de sua vida. Então, tenho pouco a contar.” Principalmente, porque quando deputado estadual, é onde eu vi coisas mais curiosas [...] eu vi casos que eu não posso contar porque as pessoas ainda vivem. Então é melhor não contar para evitar aborrecimentos.
Como eu nasci na beira do São Francisco, desse rio da unidade nacional, nesse rio que foi sem dúvida nenhuma um elo desde a sua descoberta em 1503 até hoje, ele continua e eu sou da época em era possível vir de Traipu, onde eu morava, para Penedo, onde eu estudava, de navio [...]
Eu quero então em homenagem a minha terra dizer uma poesia, que não sei de cor, mas vou ler aqui.

SAUDADE [Da Costa e Silva]

Saudade! Olhar de minha mãe rezando,
E o pranto lento deslizando em fio...
Saudade! Amor da minha terra... O rio
Cantigas de águas claras soluçando.

Noites de junho... o caboré com frio,
Ao luar, sobre o arvoredo, piando, piando...
E, ao vento, as folhas lívidas cantando
A saudade imortal de um sol de estio.

Saudade! Asa de dor do Pensamento!
Gemidos vãos de canaviais ao vento...
As mortalhas da névoa sobre a serra...

Saudade! O Parnaíba — velho monge
As barbas brancas alongando... E, ao longe,
O mugido dos bois da minha terra...

Essa poesia representa aquilo que vivi na beira do rio, pescando piaba, correndo e pegando passarinho para colocar em gaiola. Naquele tempo, a gente não tinha ideia ainda, digamos assim, de quanto é preciso fazer para manter o meio ambiente. Eu nunca tinha ouvido falar, até chegar em Penedo, em meio ambiente, até então, nunca se tinha ouvido falar nisso. Bom, mas os passarinhos pelo menos eram bem tratados. E vivi ali durante toda a minha infância, toda a minha adolescência. Como diz o poeta, pés descalços e braços nus correndo pelas campinas, chupando caju nos cajueiros e manga nas mangueiras. Atravessando o rio, aprendi a remar com meu irmão, à vela, e ali vivi boa parte da minha existência, existência que é rápida e falaz, mas que eu considero que foram anos tão bem vividos, que se eu algum dia voltar, voltarei para a fazenda Mata Verde, lá em Traipu, vivendo esses 16 anos que lá vivi.


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