terça-feira, 4 de agosto de 2015

A PERDA DE UM FILHO



A PERDA DE UM FILHO
RONALD MENDONÇA
MÉDICO E MEMBRO DA AAL

Perder um filho é algo tao absurdo que nao se encontra palavra para traduzir o que se imagina o que seja essa dor. É uma quebra na ordem natural das coisas. Pode-se dizer que é possível sobreviver-se. Ninguém sabe como, mas é possível. A metáfora de um pedaço que vai  junto,  talvez defina.
 Dá para voltar a sorrir, trabalhar, recolher os cacos que ficam nas estradas,,, O tempo é um grande aliado. Imaginar que o filho fez uma viagem para um lugar muito distante engana um pouquinho os "receptores encefálicos da perda de filhos". Afinal, há pessoas com filhos vivos que passam anos sem dar notícias...
Ter netos ajuda muito. Criar netos ajuda mais. Lembrando sempre que o neto não é o filho que Deus mandou de volta para compensar a perda. O neto é outro ser que não deve e nem pode substituir o ausente. Quem perde filho enloquece um pouco (ou muito). Eu acho que não fiquei muito normal. A propósito, ouvi de alguém bem-intencionado: “Como Deus é bom! Vc perdeu dois filhos, mas ele lhe devolveu dois netos.” Aí eu disse, “minha amiga, quantos netinhos você tem?  Quantos filhos você teve de perder para “ganhar” esse presente em forma de netos?”
 As camisas do Roninho estão no meu guarda-roupa. De vez em quando, emocionado, as uso para justificar uma lavagem. Os discos da Lavínea também estão conservados, misturados com os meus. Blusas, perfumes, jóias, livros estão sendo conservados. Não somos espíritas. Não acreditamos na tese que afirma que chorar por um filho provoca inquietude no outro mundo.
Nós choramos muito. Nós guardamos esses objetos  porque queremos ter essas lembranças deles. Nunca quisemos apagar seus vestígios de perto de nós. Com muita frequencia revejo suas fotos e algumas gravações em DVD.  Eles não envelheceram. Na verdade, nunca envelhecerão.  Se fossem vivos, a Lavínea teria 44 anos e o Roninho 38. Perdê-los não nos tornou  melhores, certamente imensamente mais tristes.
 Um dos sinais da minha loucura foi fazer um face no nome deles. Vi que não daria certo. Despertaria curiosidade desnecessária. Disse que não era espírita, mas gostaria que fosse verdade o que os espíritas sustentam. Quero imaginar a nossa alegria em reencontrá-los, abraçá-los, beijá-los e matar a imensa saudade que nunca passa. Talvez tenhamos um pouco de felicidade.

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