domingo, 1 de agosto de 2010

MÁS COMPANHIAS

Próximo a completar quatro decênios de atividade médica, tenho colecionado muitas histórias tristes. De tantas, as que mexem mais com os meus sentimentos são aquelas de envolvimento de jovens com drogas.Embora fora da minha área de atuação, o fato de pertencer ao quadro clínico de um hospital psiquiátrico faz com que me defronte com essa maldição com uma frequência assustadora. Tenho encontrado famílias aniquiladas, pais impotentes, ao lado de pacientes desesperadamente irrecuperáveis. O choque é maior nos casos em que conheci aquele usuário na infância.Ainda que estudiosos identifiquem desajustes familiares como uma das principais causas, é comum que os pais assinalem o início dos males às “más companhias”, com as quais os filhos teriam desandado, teriam feito uma espécie de curso preparatório até mergulhar de cabeça no inferno das “viagens”. Com o tempo, aquele menino bom transforma-se, ele próprio, na “má companhia” que os outros pais rotulam e abominam. É um elo maldito.
A completa dependência costuma transformar pacatos adolescentes em ousados delinquentes. Tendo como pano de fundo a ameaçadora onipresença do traficante, não existe barreira moral ou ética para a obtenção dos bagulhos, das pedrinhas, do pó, do pico. Como numa hecatombe, as residências vão se despindo de objetos valiosos. Das joias a botijões de gás, negociados a preço de banana. Na sanha destruidora, nem velhos calçados escapam (“Há sempre um chinelo velho para um pé doente”). No fim, sobram as quinquilharias que o traficante rejeita. Participação em roubos e assassinatos completa o quadro desolador. A morte precoce os espreita.Problema policial, político e de saúde pública, diria até de segurança nacional, nem Lula ou qualquer outro dirigente tiveram peito de encarar esse desafio. Agora, com a campanha para a sucessão presidencial na rua, creio ter chegado um excelente momento para discutir a questão. Revela-se estéril a insistência em comparar Lula X FHC, pelo simples fato de nenhum dos dois ser candidato.Infelizmente, as perigosas ligações do PT com as Farc (narcoguerrilheiros colombianos) certamente irão inibir as discussões. É voz corrente que a credibilidade das Farc no país de origem é baixa justamente pela conjunção promíscua com os traficantes.
Entre nós, se uma das partes insistir em classificar o tema das drogas como “baixarias da oposição”, teremos perdido uma excelente oportunidade de tentar controlar esse câncer social.

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