terça-feira, 29 de junho de 2010

CHUTES NO SACO

Dias atrás, fui surpreendido com a notícia da morte do prof. Grangeiros Neto - no plural, como ele gostava de ser tratado. Fui seu aluno de Português no velho Diocesano da Rua do Macena. Suas aulas tinham o poder de entusiasmar os ouvintes. Gostávamos de sua riqueza vocabular, da fala rebuscada, da voz empostada, dos comentários ferinos, das ironias, dos autoelogios e até do seu ar de superioridade intelectual. Ainda hoje guardo frases inteiras, tipo: “Com o rosto sulcado pelo arado do tempo...” .
Minha admiração e gratidão eram por conta do respeito pessoal, do estímulo para estudar, ler mais. Ficava encabulado, quando ele – intransigente cultor do vernáculo -, mais de uma vez se disse meu “ledor”. Naquelas horas falava de mim para comigo: “cara, você precisa melhorar para não decepcionar seu velho mestre”.
Embora não tenha acompanhado pari passu a trajetória acadêmica e profissional de Grangeiros, sabia que ele tinha vivido uma frutuosa (adjetivo que ele afirmava ter consagrado num dado Natal) vida acadêmica. Era um homem bem-sucedido também no campo jurídico, tanto que, ultimamente, dedilhando seus pianos, desfrutava das amenidades de "sua" Marechal com dignidade. O fato é que Alagoas perdeu um filho ilustre e seus antigos alunos uma das melhores referências.
Um urubu pousou mesmo na sorte de Alagoas. Menos pelo Lula, que desta vez apressou-se em por aqui passar dando uma de diligente chefe de nação. Nem sempre foi assim. Em janeiro de 2004, por exemplo, sem eleições por perto, uma cheia de proporções semelhantes às de Alagoas e Pernambuco abateu-se sobre o Sudeste, causando mortes, destruições e desabrigados. Naquela ocasião, chocaria a todos a foto do indiferente e feliz presidente nas primeiras páginas dos jornais... tocando violão. Seria comparado a Nero, o tarado que tocava cítara, lira e harpa enquanto Roma ardia em chamas. Ainda bem que desta vez não vi fotos do “último São João” no Planalto, comemorado com a grandeza do baile da Ilha Fiscal.
Não obstante as promessas de liberação de milhões para recuperar as cidades devastadas, continuo a achar que Alagoas afundou de cabeça para baixo no seu inferno zodiacal. Sim, porque se não bastassem as inclemências da natureza (e imperdoáveis irresponsabilidades humanas), eis que um dos nossos líderes políticos mais ativos é alvo de denúncias de condenação judicial, segundo a revista Istoé desta semana. Com efeito, citado com estardalhaço, junto com assessores e outros figurões, o impedimento da candidatura de Ronaldo Lessa vai além de uma dor narcísica, é mais um chute no maltratado saco do alagoano.

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