domingo, 2 de novembro de 2014

CUBA É AQUI



CUBA É AQUI
RONALD MENDONÇA
MÉDICO. MEMBRO DA AAL
Nesta semana, a Clínica de Repouso Dr. José Lopes de Mendonça completou cinquenta e quatro anos de existência. Meu pai, o fundador que lhe deu o nome, desde cedo envolveu a família no seu projeto de transformar seu hospital numa referência do ramo. Quando foi inaugurada, em 1960, existia o Portugal Ramalho e a Miguel Couto.
Inóspito, o Portugal Ramalho, do estado, lutava com grandes dificuldades que o próprio “doutor Zélopes”, como era conhecido pelo povão, sabia ex-cathedra. O outro frenocômio, Miguel Couto, era praticamente o único. Meu pai o conhecia muito bem, posto ter sido seu funcionário durante 12 anos. Recusou arrendá-lo. Preferiu começar do zero, arriscando seu patrimônio pessoal.
Em momento algum o poder público mostrou-se solidário e chegou junto com alguma ajuda. Na verdade, torcia-se até que o projeto não desse certo. O velho era obstinado. Em dois anos e sem convênios, sua clínica estava com a capacidade máxima: quarenta pacientes. A nova e definitiva sede se encaixaria como uma luva nos sonhos de crescimento.
 A “Zé Lopes” passaria a ser referência e até sinônimo de hospital psiquiátrico. Essa fama e um relativo sucesso financeiro despertariam (por que não dizer?) imenso grau de inveja destrutiva. Avesso a badalações, extremamente dedicado e morando no próprio hospital, era mesmo difícil competir com ele.
A Clínica Zé Lopes “bombou”. Chegou a ter quatrocentos pacientes. Até 1974 – coincidindo com o “milagre brasileiro” do Delfim Neto, os hospitais particulares multiplicaram-se. O exemplo corajoso do velho Zé Lopes seria imitado. Clínicas de especialidades diversas seriam criadas na cidade e no interior e até um novo hospital psiquiátrico...
A “luta antimanicomial” chegaria em Alagoas na boca dos que detestavam os donos de hospitais psiquiátricos. O eletrochoque passaria a ser satanizado. Maldosamente, esqueciam-se os casos de remissão dos surtos, dos pacientes que retornavam ao trabalho e aos lares.
Eviscerava-se impiedosamente. Os pacientes mais regredidos eram expostos nos noticiários. Babacas que  conheciam pirocas de doença mental viraram estrelas. Entrevistas idiotas ganhavam repercussão. A contra-psiquiatria caeté tinha, enfim, sua “grã-fina de narinas de cadáver”. A balofa burra e presunçosa dava entrevistas e perguntava: “cadê o doido”?
O paradoxo: com uma diária abjeta de R$ 30,00 reais quer-se diminuir o número de leitos, para reduzir despesas e conseguir uma diária menos acachapante. O poder público, que vive sacaneando, “nega-se” a aceitar. Estamos em Cuba.   

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