A MAIS MARAVILHOSA DAS MORTES
RONALD MENDONÇA
MÉDICO E MEMBRO DA AAL
Essa semana, o escritor Carlito
Lima fez a entrega da nona edição do Prêmio Espia. Peço licença para, em sua homenagem, transcrever esse texto
extraído do O Amante de Lady Chartterley, de DH Lawrence, de 1927.
“Tiveram uma noite maravilhosa de
paixão sensual; Constance, um tanto amedrontada, mas ao mesmo tempo assustada, conheceu vibrações de sensualidade ainda mais
fortes que das outras vezes. Vibrações diferentes, mais agudas, mais terríveis
que as causadas pelo amor ternura e, no momento, mais desejáveis. Apesar de um
pouco atemorizada, não se opôs a coisa nenhuma – e uma sensualidade sem freios
e sem vergonha a sacudiu no mais fundo de si mesma, e a desfez dos últimos
véus, revelando nela uma mulher nova. Não era propriamente amor. Não era
volúpia. Era uma sensualidade aguda e ardente como o fogo que lhe transformava
a alma em brasa.”
“E esse fogo destruía as mais
velhas e profundas vergonhas das suas partes mais secretas. Custou-lhe certo
esforço deixar que o amante usasse dela ao sabor de seus caprichos, reduzindo-a
a simples coisa passiva, complacente como uma escrava – como uma escrava
física. A paixão a devorava com chamas consumidoras e quando a violência dessas
chamas alcançou o mais íntimo de suas entranhas, julgou estar morrendo – embora
da mais maravilhosa das mortes.”
“Perguntava-se a si mesma que
quereria significar Abelardo ao dizer que, durante o seu ano de amor com
Heloísa, haviam passado por todos os estágios e por todos os requintes do amor.
Agora compreendia. Era aquilo. Há mil anos antes! Já representada nos mais
antigos vasos gregos. Os requintes da paixão, as extravagâncias da
sensualidade! E era coisa necessária para destruir as falsas vergonhas e
refinar em pureza o grosseiro minério do corpo.”
“Quanto não aprendeu nessa noite!
Se lho contassem, teria admitido, seria coisa para matar uma mulher de vergonha
– mas quem morreu foi a vergonha. A vergonha que não passa de medo; a profunda
vergonha orgânica, o velho medo físico que se oculta nas raízes do corpo e que
só pode ser expurgado por esse fogo sensual. Ao fogo da investida fálica do
homem ela pôde alcançar o coração da floresta do seu ser.”
“Que mentirosos os poetas e toda
a gente! Fazem-nos crer que só precisamos de sentimentos. Mas, na realidade, o
que imperiosamente precisamos é dessa penetrante, ardentíssima e terrível
sensualidade.”
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