Viver
é arriscar-se
Ronald mendonça
Médico e membro da AAL
Ignoro se a morte do cantor
Reginaldo Rossi repercutirá além-fronteiras , reverberá em terras lusas,ou na
Lutécia, capital francesa, neste ultimo recanto, movida pela breguíssima Mon
Amour, Meu Bem, La Femme. Rossi jactava-se
de cantar em francês justamente por repetir esse ridículo refrão que levava os
fãs ao delírio.
O “Rei” não era o pior cantor do
mundo, obviamente. Seu histórico remonta aos tempos da Jovem Guarda, da TV
Record. Sempre foi um coadjuvante. Esquentava microfones e plateias para os
astros principais brilharem. Marca dessa época, o tom fanhoso de Roberto Carlos grudaria na sua voz.
Depois de longo período de
ostracismo, eis que ressurgiu cantando o conspícuo “Garçom”. Estouraria a boca
do balão: “Garçom, aqui nessa mesa de bar/ você já cansou de escutar/centenas
de casos de amor...”
O tema é surrado. Mas, o fato é que o sucesso foi de tal ordem que
não havia pessoa, entre os brasileiros vivos ou mortos, que não tivesse alguma compaixão
das dores daquele infeliz chorão. O
mundo é cruel! Nosso herói acabara de receber uma carta que o tirou de tempo e
o jogou na sarjeta, digo, na mesa de um bar qualquer.
Que carta! Deixaria em frangalhos
o coração do preterido. Não era para menos: o seu grande amor iria casar com
outro, justamente naquele dia. Não obstante, não guardava rancor. Filosofava
resignado. Queria mais era afogar suas
tristezas até que o sono o derrubasse. E, pelo amor de Deus, que o deixassem no
chão.
Resgatado das cinzas do
obscurantismo, cantou à exaustão em todo Brasil. Figura carimbada em comícios,
tornou-se um cult. Salões de intelectualóides entrevistavam o redivivo
intérprete. Foi xodó de existencialistas, comunistóides, musicólogos
modernosos, micos-leões dourados e outras espécimes em extinção.
Embora sem repetir o sucesso de
Garçom, RR também faria a apologia do bom corno. Aí foram as feministas, os
psicólogos avançadinhos, os sexólogos e os tiradores de sarro que investiram. Comentarista
em glamurosos programas de TV, ar cínico, cercado de concupiscentes minissaias
e umbilicais decotes, dava lições de
tolerância aos chifres. Virou ícone. Um guru sexual. Paixão nacional. Marido
ideal.
Inimigos nem tão ocultos
conspiravam. Incorrigível tabagismo parecia ser o mais ardiloso de todos. Em
meio às badalações, o olhar de especialistas já vislumbrava ectoscopia e padrão
respiratório compatíveis com lesões pulmonares irreversíveis. Dali para o vale
das sombras foi um pulo.
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