“BARBA”, O ÓBITO MORAL
RONALD MENDONÇA
MÉDICO E MEMBRO DA AAL
Cientistas políticos, historiadores
e desocupados de todas as categorias estão diante de um pitéu de Natal para
saborear. Trata-se do relato de Tuma Júnior dando conta de que Lula Silva, o “Barba”
ou o “Boi”, como era conhecido nos aparelhos da repressão, foi um dos
privilegiados informantes do Dops. Pelas anêmicas reações, quer-se crer que o
fato já seria do conhecimento de todos. Infere-se que a crise de liderança seja de tal monta que os
companheiros preferiram digerir o sapo barbudo a degolá-lo.
Não há inverossimilhança. Afinal
de contas, quando Inácio despontou na política sindical, os militares já não
tinham tantos problemas com guerrilhas e terroristas. Ou seja, aparentemente,
Lula fazia barulho e greves por melhorias salariais, peitava as montadoras de
São Bernardo sem se incomodar se vivíamos ou não sob restrições.
Por esse prisma, a milicada recebia um verniz para poder mostrar-se ao
“mundo livre” que por aqui “as coisas fluíam, posto que até greves de trabalhadores eram permitidas”.
Lula estourava a boca do balão com discursos raivosos (nas horas vagas jogava
charme para incautas viuvinhas) e a ditadura ainda saía bem nas fotos. São
especulações que poderiam ser melhor esclarecidas pelo falecido general
Golbery, “o cérebro do regime”, a essa
altura somente em alguma sala mediúnica.
É comum apelar-se para a tortura
(caso Genoíno e outros delatores) quando se tenta justificar esse tipo de incontinência
verbal. De fato, o cara na borracha, no afogamento, no choque elétrico e não
abrir o bico... Talvez aí resida o porquê do paradoxo de um Genoíno, uma Dilma,
sobreviverem à tortura e um intelectual desarmado -Herzog, por exemplo- ser
assassinado. Lula não se inclui entre os supliciados.
Qualquer que fosse o mote, a
grande verdade é que vicejava uma espécie de cultura da “oposição confiável”. Havia
um MDB dócil, sim, não necessariamente submisso, que pretendia, talvez, que o
País caminhasse para uma normalidade democrática. Mas que aceitava, ao menos
temporariamente, as imposições da caserna. Os grandes exemplares dessa fauna eram os políticos do Rio de Janeiro, “oposicionistas”
(chaguistas et caterva), que tinham seus nomes chancelados pelo regime.
Assim, a cínica promiscuidade de
um sindicalista com uma ditadura de direita termina sendo palatável. Um
pecadilho sem maiores consequências diante daquele conceito de “sindicalismo de
resultados”. É claro que não se trata de
um Judas, de um Joaquim Silvério dos Reis... Rigorosamente, nem merece entrar na História. Não há decepção. Apenas a constatação do óbito moral.
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