UM TEXTO DE RONALD MENDONÇA
"Quem é você pra derramar meu munguzá ? Ronald Mendonça Médico e membro da AAL. Com os versos de Tareco e Mariola, do cantor Flávio José, na cabeça, e o visual nas ondas de manifestações que ora vergastam o país, alguns depoimentos têm chamado a atenção. São mensagens em tabuletas improvisadas que sintetizam as razões de estar-se ali. Às vezes, são minibiografias que dispensam explicações orais. Bem diferente daquelas modorrentas marchas pela paz que matavam de rir bandidos e governantes.
Palmirinha está dando o ar da graça. Colado ao peito, exibe uma cartolina com os dizeres: “Nasci em 1931, vi duas guerras mundiais, sobrevivi durante a ditadura. Acreditem. Não é só por 0,20. Tenho 82 anos.” Velhinha simpática, serena, bochechinhas proeminentes, a fisionomia lembrando a da atriz Eva Tudor.
Nessas passeatas que acuam os governos, também chamou a atenção do escriba dois barbudinhos à Lenin, foto de Lamarca na camiseta regata e quepes lembrando Che. Com efeito, a trocar beijocas, mantinham, a quatro mãos, um cartaz cuja principal referência era o golpe militar de 1964. Apontavam-se como “colaboracionistas” daquele período o ex-presidente FHC e o enjoado José Serra... Tirante a celebração amorosa, ali estava, talvez, a motivação para as presenças, digamos, leninistas-lamarquistas.
Vale tudo. Partidos políticos que têm tudo a ver com os momentos de dificuldades que o país vive, sem sucesso, tentaram desfraldar suas bandeiras. Queriam marcar presença como se não tivessem responsabilidades com o desmantelo: inflação ascendente e a velha corrução a pleno vapor. Internamente, festeja-se (?) uma Copa de gastos suspeitíssimos, enquanto no exterior o país é alvo de chacotas.
Palmirinha está certa ao dizer que não é pelos 0,20 da passagem que está nas ruas. De fato, companheira, há coisas mais graves. O súbito enriquecimento dos companheiros seria uma delas? Teriam sido as despesas astronômicas com os estádios o combustível que desalojou a octogenária da cadeira de balanço? Antes, quem sabe, o desconforto das ruas a sofrer o constrangimento de assistir vovô Antonio Fagundes esfregar-se, na novela, numa mocinha com idade de ser neta dele.
A boa velhinha deve ter ouvido dos netos que Lulinha Júnior esfregou-se no “gênio da lâmpada”, coincidentemente, durante o governo do seu papá. Só o Criador poderia transformar o porteiro do zoológico num milionário proprietário rural.
Quer-se crer que d. Palmirinha, acompanhou o julgamento do mensalão. Milhões de reais desviados dos cofres públicos para o partido da ética garantir poder. Palmira deve ter ficado arrasada por ver que seus ídolos não morreram de overdose, mas tiveram morte moral. Dirceu, Genoíno (Quoque Brute?), Silvinho Land Rover, Delúbio (nosso Pitágoras), Erenice Guerra e pimpolhos, Palocci... Maluf e Lula no mesmo palanque... Aposentada do INSS (?), talvez tenha sido naquelas tardes a descoberta de que os nobres parlamentares brasileiros recebiam 15º salário.
Sem apontar uma razão específica que leva Palmirinha às ruas, atrevo-me, no entanto, a corrigi-la. Nascida em 1931, jamais poderia ter visto duas guerras mundiais. Em compensação, sobreviveu a duas ditaduras: a de Vargas e a militar.
Quanto ao casal homoafetivo, também há de se rever equivocada afirmação. No afã de esculhambar, descuidou-se da honestidade factual ao apontar os exilados FHC e José Serra como adesistas ao golpe de 1964. Nada disso, contudo, tira o romantismo desse lindo encontro de almas que se dão."
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