terça-feira, 26 de julho de 2011

CRÔNICA MAIS POBRE

Estive próximo do ex-presidente José Sarney em duas oportunidades. A primeira vez aqui em Maceió, durante cerimônia na Academia Alagoana de Letras. Na ocasião, estava sendo lançado o livro ABC das Alagoas, de Francisco Reinaldo A. De Barros. Ainda sob a presidência do dr. Ib Gatto, o lançamento do livro de Reinaldo atrairia as atenções de um bom público por várias razões, certamente uma delas era a presença do poderoso Sarney. Num discurso não lido, o ex-presidente apresentou o livro (impresso no Senado), elogiou o autor, rememorou Napoleão e no frigir dos ovos foi elegante e agradável.
Na segunda vez, em Brasília, ao subir no avião que me levaria a São Paulo deparei-me com aquele ladino bigode ocupando o meu assento, na primeira fila. Embora um pouco chateado – tendo em conta a idade do usurpador –, fiz valer os meus direitos. O velho não perdeu o rebolado: pediu desculpas e logo aboletou-se em outra poltrona, também na primeira fila. Durante a viagem loroteou o tempo todo com a vizinha do lado.
Recentemente, o velho senador, citando Salomão, despediu-se dos leitores da Folha de S. Paulo onde alimentou, na condição de cronista, coluna semanal durante 20 anos. Repetindo aquela definição de Lara Resende, que dizia que o cronista é aquele sujeito que sabe as primeiras quinzes linhas de qualquer assunto, Sarney (segundo ele próprio) escreveu sobre tudo.
O que mais me agradava era a dissertação sobre sua experiência parlamentar ainda na antiga capital, quando conviveu com célebres personagens da vida pública.
Pessoalmente engrossei as fileiras dos que apreciavam seu estilo. Evidentemente, enquanto o lia tinha que abstrair sua figura repelente como ex-presidente da República, presidente do Senado, sogro de Jorge Murad, pai de Roseana, Zequinha e Fernando...
Amigo querido há décadas, Murillo Gameleira Vaz também decidiu não escrever com a regularidade habitual. Cronista nato, sem os divulgados entraves morais de José Sarney, Murillão incorpora tudo o que se diz sobre o gênero. Desde a narrativa coloquial, leve, irônica, palatável, lírica e informativa, para ser lida entre a mordida do pão e o gole do café, conforme asseguram os teóricos da literatura. Há anos fora de Alagoas, memorialista, com um histórico de lutas na combativa UNE, de vez em quando é citado na coluna do Sebastião Nery como testemunha e personagem de memoráveis andanças pelo ferrolho comunista. Sem a caneta de Murillo, a crônica perde parte do brilho.

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