sexta-feira, 5 de setembro de 2014

A CURA DA MEGALOMANIA

A CURA DA MEGALOMANIA
RONALD MENDONÇA
MÉDICO E MEMBRO DA AAL
Tinha 12 anos quando a minha família foi viver num hospital psiquiátrico. Não há muitas experiências semelhantes no mundo. Quero acreditar que a convivência diuturna com portadores de distúrbios mentais não tenha nos tornado mais ou menos “loucos” em relação à média das pessoas ditas “normais”. Adquirimos um feeling, um faro para identificar malucos a quilômetros de distância.
Se nos primórdios o envolvimento familiar restringia-se a auxiliar administrativo e a “agitador esportivo”, ao ingressarmos na Faculdade de Medicina a participação teria contornos mais “profissionais”, digamos assim. Orientados por nosso pai, aprendemos a ouvir os pacientes e a escrever o que nos era dito. A doutrina da “irrefutabilidade” dos delírios e alucinações nos psicóticos foi uma das primeiras lições.
Nas anamneses é que desvendávamos o móvel que tinha levado aquelas criaturas a procurarem auxílio num hospital psiquiátrico. De fato, não havia convencimento. O padecente estava certo de um complô entre seu vizinho e sua mulher e nada o convencia da inverosimilhança. Seus pensamentos eram lidos por todos... Americanos ou russos iriam invadir o País a qualquer momento...
Dias depois éramos surpreendidos. Submetidos a tratamento com neurolépticos ou eletrochoque, aquelas inquebrantáveis certezas haviam se desmanchado no ar como os sólidos de Marx. Convicções inabaláveis transformavam-se em meras desconfianças, quando muito. A esposa era recebida com alegria. Até o vizinho era alvo de boas vindas.
Enveredei pela espinhosa neurocirurgia, mas não me abandonou o cacoete de  observar com o olhar psiquiátrico. Às vezes é desagradável. Pior é quando invade os meus comentários políticos.
Até há pouco, por exemplo, havia uma inelutável certeza de vitória da governista. Seria um banho ainda no primeiro turno. Vaiada e detestada, a “presidenta-gerenta” brandia índices escandinavos de aprovações. Estranhamente, conversava-se com as pessoas e o nome da arrogante “presidenta-gerenta” não tinha essa bola toda. Só os apaniguados e socialistas mantinham-se irrefutáveis.
Pouco afeitos ao contrário, disseram o diabo de Aécio. Lulista travestido de oposicionista, o finado Eduardo Campos foi taxado de “Judas” por um Lula magoado. Ainda assim verteria incríveis lágrimas no enterro do rapaz.

Surgiu Marina a estourar a boca do balão. Os delírios de poder estão minguando. Incerteza e desalento habitam as almas governistas et alii. Tomaram neurolépticos e estão se curando da megalomania. Talvez não cheguem ao segundo turno.

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