Do sonho ao calote
Ronald Mendonça
Médico e Membro da AAL
Relatava o doutor Ib Gatto que um
amigo pediatra, Abelardo Duarte,
notável cultor das letras, narrara-lhe
um sonho em que se viam (ele e outros colegas) num grande anfiteatro dando
aulas a jovens vestidos de branco. Despertara
várias vezes e ao voltar a dormir as imagens repetiam-se. Ninguém precisava ser
um José do Egito para decifrá-lo
O sonho de uma faculdade de
medicina se cristalizaria meses depois. Escrevo sem consultar, mas creio que
eram doze os que assinaram a ata de fundação, na sede da Sociedade Alagoana de
Medicina, ainda no alvorecer dos anos 50 do século precedente. Doutor Ib, o persistente sonhador Abelardo,
Theo Brandão, Sebastião da Hora, AC Simões, José Lyra, dentre os presentes.
A novel Faculdade de Medicina de
Alagoas transformaria o cenário médico-científico da Província. Até mesmo seus
hábitos. As turmas compactas, tendo as
centenas de leitos da Santa Casa de Maceió à disposição, recebiam invejável
orientação didática. Muitos dos formados exerceriam o magistério substituindo
ou auxiliando os fundadores.
Esta semana, sem alardes, foi
enterrado o Prof. Alfredo Ramiro Bastos, o último vivo dos fundadores da
Faculdade de Medicina. Possivelmente o mais jovem daqueles desbravadores,
doutor Alfredo foi professor de Terapêutica Clínica, hoje extinta.
Cardiologista com passagem pelos Estados Unidos – uma exceção na época -,
chegou a ser diretor da Faculdade,
àquela altura já federalizada.
Apaixonado por esportes, foi médico
e técnico do glorioso Centro Sportivo Alagoano, onde colecionou títulos, mas
sobretudo impagáveis histórias. Treinou voleibol. A
partir de 1977 convivemos como coleguinhas de departamento. Já relatei, aqui mesmo,
a saga de um goleiro do Santanenese, “muito bom, mas azarado”. Com essa sina maldita,
o técnico Alfredo Ramiro despacharia o pretendente com antológica frase. “Pelo menos em três
profissões o sujeito não pode ter azar: cirurgião, piloto de avião e goleiro. “
Doutra feita, um famoso goleador
pediu-lhe dinheiro emprestado. Temendo o calote, exigiu que o sujeito assinasse
documento acusando a disposição de honrar. O mau pagador sentiu-se ultrajado
com a prerrogativa. “Doutor, sou um homem de bem. Parece até que o senhor não
me conhece. A minha palavra vale mais que qualquer selinho de cartório.” Chiou,
mas assinou.
-E aí, professor, o cara pagou?
-Negou fogo! Botei o sujeito na Justiça. Mudou de time. O
Regatas honrou a dívida. Cabra de peia existe em todo lugar.
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