sábado, 13 de outubro de 2012

O PÓ


O PÓ

Ronald Mendonça

Médico e Membro da AAL

O professor Bouganville era a figura mais respeitável da faculdade. O culto à sua pessoa transbordava os umbrais do santuário hipocrático. Às suas magistrais aulas acorriam alunos de todas as séries. Momentos havia de dúvidas acerca do que lhe era mais destacado, se seu cristianismo epidérmico ou a arte burnida nos sacros territórios de Epidauro.

Assim foi a figura de José da Silva Bouganville, um pesquisador incansável, desnudo das vaidades mundanas (que, a seu ver, enfraquecem o caráter e condenam a alma). Esposo e pai exemplar, nosso herói, na sua imensurável modéstia, dizia-se, só acalentava um orgulho: nunca cobrara uma consulta. No íntimo, um quase anacoreta a viver entre a família, os doentes, os alunos e a inquebrantável Fé.

O bom José um dia se aposenta. A elegância sóbria passaria a ser vista aos finais de tarde em áreas movimentadas. Shoppings e galerias viraram objetos de desejo. Nada se lhe comparava à recém descoberta da beleza das mulheres jovens, seus montes e vales. O anatomista esculpia na mente os detalhes ocultos.

O fato é que o arquétipo da moral, o pai de várias gerações de brilhantes esculápios, o fiel leitor de Santo Agostinho, tornara-se um compulsivo namorador. Ou tentava sê-lo. Os desatinos atingiriam o clímax com a sua rumorosa prisão, em plena via pública, depois de tentar assediar fisicamente uma colegial com a idade de sua bisneta.

Levado a uma perícia médica, chegou-se à dolorosa conclusão: o cérebro do eminente mestre havia murchado em áreas, justamente, que dão prumo às condutas morais. Uma carta da família esclareceria os fatos. Lida na Congregação da Faculdade, comoveria o mais empedernido dos corações. Bouganville, num rasgo de resignação, exclamaria: “Do pó vim, ao pó retorno!”.

Lembrei-me do  velho professor, depois da carta da filha de José Genoino, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como um dos chefes do mensalão. Sua biografia, até onde se sabe, e ao contrário do seu chefe no esquema e colega de condenação, o faroso José Dirceu, registra a “mão na massa”. Com desprendimento, levou o seu comunismo ao paroxismo da luta armada. Más línguas o acusam de ter capitulado aos paus de arara e entregue colegas... Como Bouganville, ele e Dirceu estão retornando ao pó.

Lágrimas à parte,  ligeiro pormenor histórico tem sido, estranhamente, escamoteado. É que ambos (o intrépido e o dissimulado) a seus modos, combateram a milicada, disso não há dúvidas. Soa como tremenda piada, contudo,  descrevê-los “democratas”  posto que suas metas sempre foi uma ditadura comunista...

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