sábado, 17 de novembro de 2012

A soberana dialética materialista

A SOBERANA DIALÉTICA MATERIALISTA

RONALD MENDONÇA

MÉDICO E MEMBRO DA AAL






Atingido em pleno vôo, participo da dor dos familiares pela precoce morte do jovem piloto alagoano Leonardo Lessa, o Léo, para os íntimos. Em ascensão profissional, irremediavelmente apaixonado pela aviação desde os primeiros passos, em várias ocasiões, teria confessado “morrer feliz” caso viesse a falecer pilotando um avião. Em meio ao sofrimento, ao vazio da ausência, fica o consolo de um ente amado ter vivido intensa e plenamente, não obstante a idade de 30 anos. Para Leonardo, a aviação foi vida, paixão e morte.

Embora digam que a Fé ajuda a suavizar a dor, infelizmente, não me alinho àqueles que advogam que as pessoas têm missões a cumprir nesse “vale de lágrimas”. Uma vez concluído o que se lhe determinou o destino, seriam chamadas de volta, ao Pai. Simples assim.  Insurjo-me contra a ideia da existência de   “outras dimensões” e que a nossa efêmera “passagem” por aqui seja uma preparação, recompensa, muito menos um castigo.

Anos atrás, num mesmo novembro, dois filhos foram friamente assassinados. Estavam em casa. Não tinham qualquer atividade de risco. Não eram seqüestradores, terroristas, viciados, traficantes, pichadores de muros, assaltantes de banco... Não participavam de nenhuma organização criminosa que dilapidasse os cofres públicos.

Estudantes jovens, absolutamente normais, alegres, cheios de sonhos, com certeza não haviam cumprido nenhuma missão especial. Tinham projetos, pensavam em concluir seus cursos, casar, ter filhos... Serem felizes, enfim.

Busquei explicações aqui e alhures. Um padre me garantiu que era obra do diabo, que estava solto pelo mundo. Estranhei a afirmação. E onde está Deus? Quis saber. “Sofrendo com os seus filhos”. E a tal folha seca que não cai sem prévio consentimento Dele? “É o livre arbítrio, querido”.

Um espírita concedeu-se proclamar uma clarividência que nem Kardec, nem Chico Xavier, nem Bezerra de Menezes alcançaram: “Seus filhos estão bem, recebidos pela avó, Rosinha. Nesse momento, a Lavínea está consolando o Roninho, meio que ainda inconformado com o ocorrido”.

O esquerdista f.p. recorreu a Marx: ´”Na soberana dialética materialista,  o crime nada mais é que o irrefreável triunfo do proletariado”.

Balelas. A anatomia do crime foi ficando claro. Um bandido abrigou-se na minha casa. Uma ex-patroa, Olímpia, fazia o papel de intrujona, recebendo produtos de roubo. A loja de armas Colt 45, criminosamente, forneceu uma caixa de balas. Um militar do exército vendeu um revólver. O resto é história para boi dormir.

A nós pais, Rosa Lessa, sobram as lembranças e as dores da saudade.


RENDA E NAMORO





Falecido na década de 90 do século passado, Ivon Curi, em declínio, viveria seu último papel na Escolinha do Professor Raimundo interpretando Gaudêncio, um gauchão macho até umas horas. Cantor e ator emplacou vários sucessos musicais e foi apreciado galã nas chanchadas da Atlântida. Tal qual o personagem do Kit Gay do ministro Haddad, hoje prefeito de SP, batia bola em todas as posições. Morreu de AIDS sem nunca haver assumido claramente a multilateralidade sexual.

Um dos seus grandes sucessos foi cantando Mulher Rendeira (“Farinhada”?), canção de domínio popular de pouquíssimos versos, mas que ganhava muita força graças às caras e bocas do saudoso artista.

“Tu me ensina a fazer renda, que eu te ensino a namorar”, refrão mais marcante tem tudo a ver com certo período da nossa recente história política. Foi justamente quando dividiram cela os condenados por crimes “triviais” (assassinatos, roubos, estupros..) e os presos políticos (teóricos, terroristas e simpatizantes).

Dessa salutar convivência teria brotado o Comando Vermelho, organização essencialmente criminosa ligada ao tráfico. Consta haver assimilado técnicas de guerrilha em aulas ministradas pelos presos políticos. Em matéria de pilantragem, conforme ficaria demonstrado, nossos guerrilheiros eram hors concours. Não obstante as evidências, os queridos amigos gauchistes teimam em considerar injuriosas tais referências. O fato é que a partir de determinado momento, explodiriam os seqüestro, crimes até então,  de uso, digamos, restrito dos terroristas de esquerda.

Não vamos exagerar e dizer que assaltos a bancos fizeram parte desse curso. É que ambas organizações (terroristas e traficantes) os praticavam à larga mano. No máximo, nesse quesito, houve troca de know how.

E assim se passaram os anos. Embora neguem, nossos “guerrilheiros” tomaram o poder e se transformaram em irretocáveis burgueses. Penteados, trajando impecáveis Armanis, exalando loção francesa, até escovam dentes, usam desodorantes e trocam de cueca. Os langanhos axilares,marca registrada das militantes, fartos e fétidos na época de revolta, graças a Deus, sumiram. Gordos saldos bancários e “apês” em Higienópolis, dentre outros mimos, completam o kit.

Como relembra Douglas Apratto, “a história não se repete, a não ser como farsa”, temos agora uma tremenda coincidência que nem Rasputin, nem Roberto de Ogum conseguiriam antever. Juntos de novo, compartilhando segredos e sonhos, Beira-Mar, Marcola, Zé Dirceu, Genoíno e Delúbio. De quebra, Kátia, Valério e outras pilombetas.

O coral do presídio já ensaia o refrão: “Tu me ensina a fazer renda/ Que eu te ensino a namorar//”.